É mais do que consolidada a máxima afirmativa, apesar da contraposição de alguns insistentes céticos, de que quem está em crise são as empresas jornalísticas, não o jornalismo. Isso reflete um conceito ainda mais básico sobre tudo o que vem ocorrendo nos últimos anos: nós queremos o jornalismo, não o jornal, ou seja, não importa o meio que ele será consumido, o que o público consumidor de notícias quer é um jornalismo ético, transparente, consolidado e firme de suas convicções.
Porém esse debate, mesmo trazendo consigo traços de cenários mais atuais, já se encontra defasado, desgastado e até mesmo infértil para novas discussões. O que deve ser feito com urgência é direcionar olhares para um tema muito mais amplo e complexo, porém capaz de definir de uma maneira muito mais estrutural os futuros – ainda incertos – da imprensa: é preciso inovar no jornalismo assim como foi e é preciso inovar em qualquer outro setor da sociedade para que um determinado ramo do mercado permanecesse de pé.
O que isso significa na prática? Bom, inovar no jornalismo não se traduz apenas em inserir imagens ou vídeos produzidos pelos chamados jornalistas-cidadãos. É preciso ir além do comodismo no qual se encontra grande parte dos profissionais. Foi extremamente – e ainda o é – ardiloso inserir a cultura digital dentro de algumas redações e até mesmo nos semanários de cidades pequenas (jornais produzidos muitas vezes por um único profissional) onde se pressupunha uma liberdade de ousadia muito maior do que a dos grandes conglomerados midiáticos.
Credibilidade e inovação
Porém o buraco é mais embaixo e a bola da vez já não se resume aos fatores digitais, mas em como o jornalismo irá acolher a inovação com o intuito de se reinventar em pleno século 21. Hiperlocalismo, mobilidade, infografias tridimensionais, narrativas multimídias, design responsivo, manipulação de dados, aplicativos customizáveis ou realidade aumentada. Muitas das ferramentas já estão aí e tantas outras ainda serão construídas com a consolidação da pós-modernidade, mas a questão é: quando o jornalismo irá entrar de vez nessa história?
Alguns especialistas e renomados professores acadêmicos já afirmaram que em pouco mais de 400 anos nenhuma mudança drástica ou significativa envolveu a imprensa. O conceito de monólogo permaneceu por quase toda a existência do jornalismo. O veículo produzia o conteúdo e um seleto público o consumia, sem maiores feedbacks, já que esse público dispunha apenas de plataformas estruturais que não permitiam qualquer tipo de contra resposta nas reportagens, facilitando para que o jornalismo emoldurasse sua essência de intocável, inquestionável e, principalmente, imutável.
O que temos agora são canais sociais digitais conectados em rede que permitem que os passivos consumidores de informações partam para o ataque, exijam mudanças no jornalismo e até interfiram no modelo de negócio dos grandes veículos. Sem grandes novidades e mudanças, o que temos é um jornalismo baseado em releases ou desastres que não traz nada de novo e abre espaço para que usuários da web com alguma opinião relevante e muita vontade de inovar na comunicação ganham segmentos de públicos cada vez maiores.
O jornalismo estaria sendo sufocado por esses canais? Obviamente que não, mas enquanto perdurar a filosofia de não mudança, mais e mais leitores, usuários e telespectadores irão partir para outros canais que tenham algo novo para oferecer, nem que seja a capacidade de tirar o leitor da zona de conforto e ser estopim para grandes discussões acerca dos mais variados temas, fator que, por incrível que pareça, alguns setores do jornalismo (e podemos dizer do grande jornalismo) estão deixando de lado. O jornalismo precisa ser imutável na credibilidade, mas requer urgentemente doses consideráveis de inovação. A era do jornalismo a base de botox não irá durar para sempre.
Texto no Observatório da Imprensa.