O jornalismo passa por reformulações em suas estruturas e, principalmente, procura alternativas viáveis para se adaptar ao mundo digital. Isso ocorre em todos os cantos do mundo, onde empresas de comunicação estudam maneiras de integrar as novas tecnologias aos novos formatos de consumo de notícias, cada vez mais móveis e participativos, sem contar a busca por formas eficientes de engajamento e geração de receitas.
No caso específico do Brasil, problemas mais básicos podem ser enxergados como entraves para a disseminação de um jornalismo digital mais dinâmico e desenvolvido. O país ainda passa por dificuldades tão básicas que pensar em um jornalismo integrado em um ambiente inóspito chega a ser contraditório. Não é preciso ir muito longe para analisarmos tal fato. Para que um veículo tenha audiência, é preciso que tenha um público para atingir. Com uma internet de banda larga mais lenta do que a da Etiópia, investir em novos formatos fica tão complicado quanto pensar em gerar lucros. Não há como produzir um produto jornalístico de qualidade se não há um mercado consumidor.
Não só a banda larga, mas também todo o acesso móvel é caríssimo e absurdamente precário, digno de um país obscuro em seu subdesenvolvimento, não refletindo os olhares internacionais para com um país emergente. Aliás, aparelhos comotabletstambém passam por altíssimos preços, sobretaxados tão pesadamente que se torna inviável um consumo em massa nesses formatos.
Sementes em terreno é infértil
Outro fator importante para o não desenvolvimento do jornalismo digital no Brasil é quanto ao impresso propriamente dito. O impresso sempre foi trabalhado como símbolo de status, sendo instrumento das elites escolarizadas e economicamente superiores. Com o aumento da renda, adquirir jornais impressos é uma questão de “poder conquistado”.
Isso pode ser provado com a última pesquisa sobre o consumo de notícias do instituto Datafolha, que apontou uma margem de 73 milhões de brasileiros que preferem consumir notícia no impresso a meios eletrônicos, esses ficando em 50 milhões. Isso pode ser reflexo de tudo que já foi citado anteriormente, como conexão precária e cara, aparelhos incompatíveis com a renda do brasileiro, além do fato do impresso representar, na prática, uma guinada de classe social.Há ainda fatores como escolaridade baixa, altos níveis de analfabetismo funcional e a falta de cultura nos veículos nacionais que teimam em não investir em laboratórios próprios de pesquisa. Os principais meios do Brasil apenas reproduzem o que o New York Times ou Guardian fazem lá fora. Não criam nada de novo, apenas readaptam o que grandes mídias já usam.
Com ambientes não favoráveis e veículos jornalísticos tão acomodados, como criar um jornalismo digital com a nossa cara? Ter apenas as sementes de nada adianta se o terreno é infértil.
Texto no Observatório da Imprensa.