As maneiras para se cobrar por um conteúdo jornalístico na rede não param de surgir. Depois das dezenas de investidas de grandes jornais ao criarem assinaturas digitais para o conteúdo que estiver na web – o que gerou recentemente uma queda de mais de 5% no tráfego do New York Times –, há alguns gurus que apontam a solução dos cliques. Matéria com maior número de visualização ganha mais, o que consequentemente daria maior remuneração ao jornalista que recebesse tais cliques.

O jornalismo quer cobrar dos leitores. O jornalismo quer cobrar dos autores. O jornalismo está tão freneticamente perdido que já confunde o público dos bastidores. Um número maior de cliques não significa, necessariamente, um texto mais bem elaborado. Um artigo com centenas de milhares de cliques nem sempre é o que foi mais trabalhoso e o que possui maior teor jornalístico relevante para a sociedade.  

Em uma primeira análise superficial, a ideia até que é interessante. Você remunera melhor quem trouxe mais tráfego para seu portal. Porém, observando com mais foco, se grandes e renomados jornais querem cobrar por visualizações, que pendurem uma melancia no pescoço, abusem do sensacionalismo barato ou apelem para reportagens de cunho mais popular, gerando a curiosidade de quem “passa” pela avenida digital de informações.  

Jornalismo digital é apenas jornalismo  

Se por um lado a cobrança do conteúdo digital afasta os leitores, a remuneração via cliques pode fazer com que uma matéria ou artigo realmente bom seja modificado apenas com o intuito de receber mais visualizações. Os temas mais delicados, como política ou economia, poderiam sofrer avalanches de deformações e olhares afastados somente em busca da audiência. Perde-se, nesse caso, credibilidade e relevância. Aquele determinado jornalista ganha mais porque recebe mais cliques ou recebe mais cliques porque sabe mais?    

Os textos mais “sérios” e estruturados poderiam, nesse contexto, perder o pouco espaço que ainda possuem entre os mais jovens. A superficialidade tem campo fértil para sobressair sobre o jornalismo apurado, formulado e contextualizado. A lógica quantidade versus qualidade não se aplica de maneira simples ao jornalismo. Jornalismo é conteúdo, é credibilidade, e não número de cliques e visualizações. Tanto é que os grandes portais noticiosos não utilizam apenas tais estatísticas para emplacarem confiança; eles utilizam qualidade para se consolidarem como meio de comunicação jornalística.  

Seguindo essa linha de raciocino, quem recebe mais cartas na redação ganha mais? Nesse caso, o colunista da Veja, Diogo Mainardi, deveria ser o mais bem remunerado de todos os tempos nos corredores da Abril. A proposta é inovadora, mas inusitada. Buscar a todo o custo números no lugar de conteúdo pode ser um agravante ainda maior para a cristalização do jornalismo digital. Isso demonstra apenas a falta de rumo e a insegurança que os grandes meios estão tendo. Jornalista deve fazer jornalismo e não barganha por cliques. Jornalismo digital é apenas jornalismo e nada mais. O resto é só consequência.  

Texto no Observatório da Imprensa.